Autor: Antônio Márcio Buainain, Eliseu Alves, José Maria da Silveira, Zander Navarro (Editores)
A história da agricultura mundial no último meio século tem sido, sobretudo, a história de transformações produtivas, impulsionadas pela ciência e pela intensificação tecnológica, e a resultante expansão da capacidade produtiva, pari passu com o crescimento da demanda de alimentos. Nesse período, afirmou-se um arranjo tecnológico que atendeu aos interesses dos produtores e dos demais atores envolvidos, e que a literatura, a seu tempo, intitulou de “agricultura moderna”, padrão que gradualmente foi disseminado nas regiões agrícolas do mundo, inicialmente na Europa e posteriormente em outras regiões.
Esse pioneiro impulso tecnológico transformou radicalmente as agriculturas de diversos países, inclusive as de muitas regiões agrícolas do Brasil, fomentando a modernização da atividade a partir do final dos anos 1960. A própria Embrapa, que viria a ter um papel central nesse processo, foi criada como parte desse esforço, em 1973. Promoveu-se, desde então, uma transformação tecnológica e organizacional que lançou as sementes formadoras de impressionantes competências entre os produtores e alicerçou as capacidades produtivas que viabilizaram a expansão econômica e comercial da agricultura nas décadas seguintes.
Essa seria a marca da agricultura brasileira na virada do século 21, colocando-a como o motor mais dinâmico da economia brasileira.
Esse processo foi certamente desigual e heterogêneo, como seria inevitável em face da profundidade, do escopo e da abrangência territorial das mudanças socioeconômicas desencadeadas no meio rural brasileiro. Tampouco foi linear, e no caminho foram (e têm sido) encontrados diversos obstáculos, decorrentes da crescente integração econômica entre a agropecuária, a indústria e os setores de serviços associados às nascentes cadeias produtivas, dificuldades que nem sempre foram enfrentadas com base em uma visão estratégica clara da importância e do papel da agricultura para o desenvolvimento brasileiro.
A densidade financeira e a complexidade das estruturas chamadas de cadeias agroalimentares não se formariam sem tensões, inúmeras contradições e até mesmo conflitos.
Em período mais recente, que data provavelmente da segunda metade da década de 1990, a agropecuária brasileira passou a vivenciar outro momento de sua história.
A dimensão financeira tornou-se ainda mais significativa, tanto para os produtores diretos quanto para todos os atores à sua volta, dos fornecedores de insumos aos processadores das mercadorias agrícolas, e também para o Estado, e suas políticas, e ainda para as novas instituições que foram nascendo. Animados pela extraordinária expansão produtiva e pelo papel destacado que o Brasil assumiu no plano internacional, os produtores, protagonistas dessas transformações, intensificaram os investimentos e estão se preparando para transformar o Brasil no maior produtor mundial de alimentos e matérias-primas de origem agropecuária. Os obstáculos não são pequenos e envolvem múltiplas frentes de ação – como infraestrutura da logística, tecnologia e marco institucional –, para manter a sustentação do padrão técnico que atualmente se consolida com robustas raízes no Brasil, e que está na base do crescimento da agricultura brasileira. Nenhum fator é tão importante como as exigências de manter e ampliar a capacidade de gerar tecnologia e, ao mesmo tempo, de intensificar o processo de inovação e estendê-lo para as regiões e os produtores que ainda não se integraram a esse processo de transformação.
Diante desse breve quadro histórico, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), com imenso orgulho e justa alegria, oferecem aos interessados este amplo e denso livro. Amplo por seu incomum número de capítulos e páginas, e denso sobretudo em relação à amplitude dos subtemas analisados e às competências acumuladas para tratar o estado atual, os desafios e as perspectivas da agropecuária brasileira.
Trata-se de uma iniciativa singular em nossa história acadêmica e científica. Reunindo 51 pesquisadores e um grande número de instituições que abrigam esses experimentados estudiosos da dinâmica social e econômica das regiões rurais, é nossa expectativa que este volume possa ser um referencial na literatura dedicada à interpretação dos principais processos que atualmente determinam os contextos setoriais, regionais e as especificidades de diversas partes das complexas cadeias agroalimentares que vão sendo estruturadas nas regiões rurais. E assim, há de ser um divisor de águas em nossos estudos sobre a história rural brasileira. Mesmo que a principal tese-guia que comanda o esforço analítico do grupo de pesquisadores possa ser recebida com alguma cautela, em seus ângulos conceituais e em suas evidências práticas, parece ser mesmo inegável que a atividade econômica agropecuária entrou em uma nova fase de sua história, com profundas implicações para todos os segmentos, direta ou indiretamente envolvidos, o que repercutirá gradualmente até mesmo em instituições de forte consolidação e que adentram outras esferas da vida social, como, por exemplo, as instituições universitárias dedicadas à educação superior, como os cursos de Agronomia. É preciso, como faz o conjunto de pesquisadores que assinam os capítulos, aprofundar os debates, promover mais pesquisas empíricas detalhadas, intensificar as discussões entre todos os interessados, agentes públicos e privados, pesquisadores e atores sociais e econômicos vinculados à vida rural, sendo essa a única forma de encontrar caminhos para enfrentar os bloqueios que se formam e para promover interpretações consistentes sobre as realidades agrárias. Mas também para intensificar e estimular as dimensões positivas e virtuosas desse processo de transformação produtiva – a favor, sempre, da sociedade brasileira e de seu bem-estar.
Nossas instituições sentem-se profundamente recompensadas e gratas aos seus autores: não houve alocações financeiras para a sua realização – todos os pesquisadores ofereceram o melhor de seus esforços intelectuais, de forma voluntária e sem nenhuma remuneração, em um genuíno envolvimento acadêmico, típico das melhores tradições da atividade científica. Trata-se, em sua maioria, de um grupo de pesquisadores jovens, mas igualmente inclui alguns dos nomes mais representativos e consolidados das Ciências Sociais no Brasil; é iniciativa que integra instituições as mais diversas, públicas e privadas, federais e estaduais; agrega várias unidades da Embrapa, situadas em regiões com distintas facetas produtivas; reúne especialistas em temas muito particulares e que tratam a nova agricultura e seu padrão produtivo por ângulos variados, assim como vários economistas, sociólogos, engenheiros, agrônomos, cientistas políticos e juristas. Ademais, a publicação, repercutindo uma atividade econômica que se tornou grandiosa em sua magnitude econômica e financeira, oferece contribuições de profissionais ligados às empresas privadas, talvez sugerindo uma atitude nova, que seria saudável para o Brasil – o diálogo mais frequente e aberto entre setor público e agentes privados participantes das cadeias agroalimentares, entre universidade e instituições de pesquisas e entre setor produtivo e empresas.
O livro é, portanto, resultado de um esforço plural, no mais abrangente e generoso sentido que se pode atribuir a esse atributo, tão essencial da democracia.
Eis o livro, à disposição de todos os interessados. Que a sua publicação cumpra a promessa potencial – estimular fortemente o debate, multifacetado e rigoroso, sobre o momento atualmente vivido pela produção agropecuária e seus atores, sobretudo as famílias rurais que perseveram na atividade. O Brasil precisa de uma agropecuária que seja economicamente sólida, mas também requer regiões rurais prósperas e mais justas no tocante à distribuição da riqueza gerada. Que este livro possa também contribuir para que o Brasil trilhe esse caminho virtuoso.
Maurício Antônio Lopes
Presidente da Embrapa
Fernando Sarti
Diretor do Instituto de Economia da Unicamp
Manuel Otero
Representante do Escritório do IICA no Brasil
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  O Instituto de Economia da UNICAMP foi criado em 1984 e tem por finalidade a promoção do ensino e da pesquisa na área de Economia.
O Instituto de Economia da UNICAMP foi criado em 1984 e tem por finalidade a promoção do ensino e da pesquisa na área de Economia.
